Como tudo começou

No alto da montanha em uma casinha estranha no meio do Sertão, uma família está aflita e com toda razão. Uma jovem senhora de nome Rosalita e apenas 21 anos de idade, aguarda deitada em sua cama já molhada pelo suor que lhe escorre ao corpo, a chegada de seu marido Carlitos que foi buscar uma parteira para ajudar em sua primeira gravidez.

Rosalita é uma mulher branca, cabelos pretos e longos – até o meio das costas, estatura mediana e muito valente. Seus olhos castanhos claros podem ser encontrados no fundo de uma olheira profunda adquirida por sua dupla jornada de trabalho na única biblioteca da cidade. Mulher estudiosa, aproveita as horas vagas para ler poesias e romances – os ingleses são seus preferidos, também estuda os livros de história, geografia, português e matemática, pois, almeja ser professora um dia.

Carlitos é um rapaz de 23 anos, pele parda queimada do sol, cabelos pretos, olhos pretos e firmes – sempre atentos a pequenos detalhes, um jovem alto e forte, características bem apropriadas a seu duro trabalho como lenhador. Dono de uma perspicácia e humor sagaz está sempre rodeado de amigos e com um belo sorriso no rosto.

Casaram-se apaixonados, mas para fugir de casa, não aguentavam a vida dura que tinham na casa dos pais severos. Foi um casamento simples, mas inesquecível para as vinte pessoas que celebraram a alegria destes dois jovens corajosos.

Agora, pouco mais de um ano de casados esperam seu primeiro filho e Rosalita já agoniza de dor, sentindo a dilatação do colo chegar próximo a 6 cm, contrações leves sentidas na parte baixa das costas passando para frente, abaixo do abdômen. Emoções confusas, ora rindo ora chorando, risos nervosos sem saber se Carlitos está por chegar, mas também porque seu filho estará em breve em seus braços, choros de medo por ser mãe de primeira viagem.

Carlitos entra esbaforido pela porta acompanhado de Dona Zeferina, a melhor parteira da região, uma senhora negra, crioula e com um sorriso amável no rosto e mãos delicadas e fortes. Encontra Rosalita andando de um lado ao outro tentando acalmar-se, pois as contrações estão cada vez mais fortes e mais demoradas.

Dona Zeferina passa a encher com água morna uma grande tina retangular que traz em suas mãos e coloca Rosalita dentro para relaxar. Carlitos tenta conversar para distraí-la um pouco, mas é impossível, a dilatação já atinge os 10 cm necessários para o parto, Rosalita está irritada, contrações intensas e com força total, cerca de 60 a 90 segundos de duração com intervalos de 2 a 3 minutos, por isso o descanso é pouco e a necessidade de se concetrar na respiração é imensa. A bolsa d’água estoura, chegou o grande momento, Rosalita sente seu corpo começando a empurrar algo para fora dele e então faz força. As contrações são intensas e dolorosas, Rosalita começa a sentir uma queimação no momento que a cabeça do bebê atinge a vulva, a dor aumenta conforme o bebê vai saindo e quando parece que já não aguentará de dor ouve um choro agudo ao mesmo tempo que a pressão sobre seu corpo diminui, sim é seu bebê… ele nasceu, Juca Mulato nasceu saudável e com um grito forte. Tudo ocorre bem para Rosalita também, sua dequitação – expulsão da placenta e da bolsa de líquido aminiótico vazia ocorrem 20 minutos após o parto, agora é só esperar o período de quarentena para a total recuperação da mamãe que já está com seu filho nos braços amamentando-o, em um dos momentos mais sublimes da natureza.

Carlitos está ao lado de sua amada, olhar maroto e sorriso largo, observando seu pequeno ser faminto, enquanto acaricia suavemente os cabelos de Rosalita. Dona Zeferina se retira e deixa o lar desta família com a sensação de mais um dever cumprido que lhe enche de satisfação e alegria.

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